O maravilhoso e desafiador mundo do terceiro milênio reclama de cada ser humano postura mais responsável.
Era uma vez certo menino que lá pelas décadas de 50 e 60 mirava o distante ano 2000, como se fosse algo pessoalmente inatingível. Não conseguia imaginar-me idoso e acreditava que não alcançaria a troca de milênio. Mas, toda a minha geração especulava, também eu, como seria o século 21. Os mais idealistas pensavam- -no como o século da paz mundial, uma nova ordem mais justa sendo atingida pela humanidade. Ao longo das décadas restantes, foram sendo imaginados os progressos científicos a serem alcançados, houve época em que se cogitou que já estaríamos fazendo viagens interplanetárias.
Muitas previsões não se realizaram. O desenvolvimento científico e tecnológico foi por outros caminhos. Surgiram a internet, o mundo virtual, as redes sociais e a aldeia global, comunicando-se instantaneamente. E tantos outros inventos e avanços não cogitados.
Lá pelas décadas de 1950 e 1960 vivíamos a ansiedade pelo risco nuclear, a tensão dos conflitos entre os blocos capitalista e socialista, profundas diferenças entre mundo desenvolvido e subdesenvolvido, crises políticas neste Brasil. No transcorrer do tempo de lá até aqui, alguns se apressaram em proclamar o fim da história, achando que estava definida uma hegemonia sobre a humanidade, os conflitos serenariam e uma ordem se imporia. A história não acabou, o mundo continua conflituoso, as profundas diferenças entre pobres e ricos sobrevivem, as ideologias e visões diferentes acerbam ânimos e parece que não aprendemos com as lições do século 20 e temos novas aventuras, algumas autoritárias e violentas.
Não sou saudosista. Aposto no progresso e na busca pelo melhor. Todavia, tenho de reconhecer que ao lado de avanços e melhorias, vivemos retrocessos e novos problemas.
Na verdade, este é um século de formidáveis ferramentas postas à disposição de cada um. Como ferramentas podem ser utilizadas para o bem ou para o mal. O que me parece é que, em geral, nós não estamos preparados para conviver responsavelmente com os meios que temos à disposição, com a instantaneidade da comunicação, com o prodígio das redes sociais. Sinto que indivíduos se transformam na comunicação virtual e libertam os demônios que controlavam nas relações do dia a dia. Vejo, abismado, pessoas de bom nível cultural e ético deixarem- -se manipular pelas notícias falsas da internet e, o que é bem pior, darem repercussão, mandarem adiante boatos ou falsos informes. Concorrem assim para criar o efeito de manada nas multidões em cima de supostos eventos não acontecidos, ameaças inexistentes, alarmes inverídicos.
O maravilhoso e desafiador mundo do terceiro milênio reclama de cada ser humano postura mais responsável. Pela falta dela estamos vendo crescerem violências, distorções e riscos. Das relações entre pessoas às interações entre grupos, classes e países. Não imaginava chegar ao século 21 e ter de bradar o verso da canção de protesto da minha geração lá na nossa juventude: vivo num tempo de guerra, um tempo sem sol.